terça-feira, 28 de julho de 2020

Realités paralléles

Caso de polícia


    Essa aventura se passa em três momentos distintos. O primeiro, nos tempos do Barão de Rothschild (“Por que o Barão de Rothschild estava certo?”); o segundo, durante o reinado do Conde Rubro (“Os bastidores da Gangue do Alemão”); e o terceiro se passa na dramática transição observada em “Epílogo de novela” e em “Meus últimos dias na Corporação”.

Apresentarei três viagens no espaço-tempo que Jacques Aphonsus realizou nos contextos citados acima. Jacques gravou em áudio sua jornada, enviando-me por correio a fita em um envelope. Procurei ser o mais fiel possível durante a transcrição.

Vale lembrar que eu era o melhor amigo de Jacques Aphonsus (por isso ele me enviou o áudio). Essa narrativa nada tem a ver com o ocorrido em “O caso Thiago Afonso” (Note que “Jacques” é “Thiago” em francês).

 

Parte I: Introduction

Jacques Aphonsus se mudou para o município de Yuka León no mesmo ano em que o ministro da educação Wagner Apfelstrüdel abriu um universo paralelo. Esse acontecimento nunca foi noticiado pela mídia local. Eu descobri graças aos relatos de Jacques.

Conheci Jacques na escola. Nós tínhamos oito ou nove anos na época.

“Como é o seu nome?”, perguntou Jacques.

“Flatcher.”, eu disse. “E o seu?”

“Jacques.”

Foi assim que começou nossa amizade, interrompida pelo que viria a acontecer, alguns anos mais tarde.

Jacques me contou que Wagner Apfelstrüdel (ministro da educação na gestão Donnerstag) encontrou-se com o primeiro-ministro britânico Paul Donnerstag, um ano antes de começarmos a escola.

Wagner disse que queria duas formações diferentes de alunos. Em uma categoria, os jovens estudariam por oito anos, como sempre tinha sido até então. A segunda categoria formaria pupilos em nove anos. O ministro da educação, Apfelstrüdel, não queria que os estudantes da categoria 1 perdessem um ano, deixando que as cobaias da categoria 2 iniciassem o experimento. Essa mudança aconteceria em todas as escolas da Grã-Bretanha, e a nossa seria a primeira.

Saint-Magdalena não é uma instituição de ensino ordinária. A começar pelo nome. Seu nome oficial é Magnetita Escola de Inteligência Secreta (ou M.E.I.S.).

Saint-Magdalena localiza-se na pequena cidade de Yuka León, na Inglaterra, quase na fronteira com o País de Gales. Apesar do nome em espanhol, fala-se inglês em Yuka León. Os fundadores da cidade eram latinos, provenientes do México. Foram eles que introduziram a batata-baroa na Europa, fazendo muito sucesso. Yuka León é comandada por um homem de posses muito poderoso, chamado Henry Zürich.

Na Escola Saint-Magdalena, os alunos não entram por interesse dos pais. Quem define se a criança deve estudar lá é o Estado. Uma comissão, formada por pedagogos e cientistas, une-se, por baixo dos panos, no gabinete do ministério da educação e analisa todos os possíveis entrantes. Os candidatos são os nascidos seis anos antes da análise, que é feita no final do ano letivo, entre maio e junho. Antes da reforma de Apfelstrüdel, eram sete anos.

Pois bem, um ano depois da chegada de Jacques Aphonsus a Yuka León, seu arquivo foi selecionado para entrar no grupo 1 (oito anos de ensino). Assim como eu. Dois anos mais tarde, eu viria a conhecê-lo.

 

Parte II: Les erreurs

Com onze anos, as coisas mudaram.

A Magnetita Escola de Inteligência Secreta percebeu meu empenho nas atividades e recomendou-me que eu fosse para Montréal, no Canadá, iniciar o treinamento na Academia Superior de Agentes em Formação (ou A.S.A.F.). Passei, a partir daí, a me corresponder com Jacques Aphonsus, por e-mails criptografados.

Em um desses e-mails, Jacques contou-me que andava conversando com uma professora sobre viagens temporais. Eu a conheci, pouco antes de embarcar para Montréal. Seu nome era Lilian. A matéria que ela lecionava era Física Molecular Aplicada.

Lilian mostrara para Jacques um artefato que ela vinha construindo fazia dez anos, em parceria com seu marido Wagner Apfelstrüdel. Seu objetivo era receber um prêmio Nobel ou outra gratificação.

“O que esse objeto faz?”, perguntou Jacques.

“Ele faz a pessoa que o utilizar viajar no tempo. Basta ajustar algumas configurações e voilà!”, disse a professora Lilian. “É uma pena que o aparelho esteja em fase de testes...”.

Meu amigo ficou impressionado com a invenção. Logo, ele e Lilian descobririam que o artefato seria capaz de descobrir dimensões diferentes, e viajar no tempo seria uma consequência.

Antes de entrar nesse assunto, pretendo tratar de dois episódios que aconteceram a Jacques Aphonsus (e serviram de estopim para o que viria a seguir).

No mês de agosto, visitamos a cidade de Rotterdam, na Holanda. Jacques e eu ficamos em quartos diferentes. Ele contou-me que dois nobres compartilharam seu aposento, o Barão de Rothschild e o Visconde de Chesterfield.

Combinei com Jacques de, ao final do primeiro dia em Rotterdam, para aliviar a exaustão, relaxar na área comum da hospedagem, onde havia uma piscina.

Jacques apareceu pontualmente para nossa pequena reunião. O detalhe é que ele estava usando sunga. Para mim não era problema. A questão foi ele ter que se resolver com o Barão de Rothschild, que se sentiu envergonhado pela suposta vergonha que Jacques passou.

“Você é uma vergonha por envergonhar a si mesmo!”, palavras de Rothschild ipsis literis. O Barão de Rothschild foi jantar com o Visconde de Chesterfield e a condessa de Vermont na Maison de Trois, deixando Jacques Aphonsus estirado na cama, envergonhado pela vergonha de outrem à sua vergonha.

O segundo caso agrada-me.

Em fevereiro do ano em que tínhamos onze anos, Jacques convidou-me para passar o feriado prolongado de Mardi Gras na residência de veraneio de seus pais em Plymouth.

A casa ficava em um loteamento, onde também moravam membros da nobreza e da burguesia.

A irmã de Jacques era conhecida como Ciclope. A filha do vizinho (e prima) de Jacques era a Anormal. Cleópatra e Medusa eram familiarizadas de Ciclope e Anormal. Formação de quadrilha é o conjunto de quatro pessoas ou mais. Com isso, formou-se o grupo mais temido da região: a Quadrilha de Plymouth.

O aniversário de Medusa era no começo do mês de março e as mães da comunidade de Plymouth decidiram organizar um evento que juntasse Mardi Gras e o aniversário de Medusa.

Jacques e eu oferecemo-nos de prontidão para cooperar com os preparativos da festa.

Algumas horas antes de começarmos a organização, resolvemos ir brincar no recém-aberto tobogã da piscina. Quando chegou a hora de Jacques escorregar, ele foi de bruços, para dar mais emoção. Eu alertei-o que poderia dar errado, mas ele teimou.

Anormal, a vizinha dele, que estava logo atrás na fila, não viu que ele ainda estava na piscina e escorregou sem pensar duas vezes. Jacques emergiu d’água mais ou menos na mesma hora em que Anormal submergiu. Os dois encontraram cabeça com cabeça e, talvez, Jacques tenha ficado com danos cerebrais leves.

Eu e meu amigo Jacques fomos para casa dele como se nada houvesse acontecido. Banhamo-nos, almoçamos e fomos para o salão de festas, cooperar na confecção do evento.

Não nos pronunciamos sobre o ocorrido na piscina mais cedo, nem quando Anormal queixara-se de “dores de cabeça infernais”.

Medusa, Ciclope, Anormal e Cleópatra permaneceram na piscina, debatendo sobre os mais variados assuntos.

O tempo mudou ao final da tarde, esfriando a temperatura. As meninas da Quadrilha de Plymouth tinham toalhas para secarem-se e roupas para trocarem-se. Com exceção de Cleópatra.

“Jacques, posso emprestar sua toalha?”, perguntou Cleópatra, ao observar uma toalha com estampa de desenho animado encostada numa cadeira onde Jacques estava sentado.

“Fique à vontade, Cleópatra!”, disse Jacques. “A toalha é sua!”

Jacques não imaginava que o que ele havia dito em sentido figurado fosse compreendido por Cleópatra ao pé da letra. Meu amigo nunca mais viu sombra da sua toalha.

Em novembro do mesmo ano, eu já estava em Montréal, mas Jacques não. Ele estava na aula de Física Molecular Aplicada, quando, ao término da aula, a professora Lilian murmurou:

“Venha comigo.”

“OK.”, murmurou Jacques de volta.

A professora Lilian levou-o para mesma sala onde ela apresentou-lhe o artefato especial.

“Quero testar esse aparelho.”, começou ela. “Você topa participar do experimento, Jacques?”

Ele fez que sim com a cabeça.

A professora Lilian colocou o objeto no chão e apertou alguns botões. Jacques observou com atenção todos os movimentos, para conseguir repetir, se necessário. Uma fumaça de cor violeta flutuou no ar, acima do artefato.

“Bon voyage!”, disse a professora Lilian.

“Como você vai saber que deu certo?”, perguntou Jacques.

“Você vai encontrar minha versão na outra realidade. Converse com ela e explique que fui eu que te mandei.”

Jacques assentiu.

“Tem combustível o suficiente no objeto para cinco viagens. Use com sabedoria!”, continuou a professora Lilian.

Jacques agradeceu às recomendações de sua professora e entrou na fumaça de cor violeta.


Jantar de negociação com Jacques e membros da Quadrilha de Plymouth


Parte III: Renaissance

Lembro-me de que dias depois do desaparecimento de Jacques, noticiários de toda a Grã-Bretanha faziam a mesma pergunta: “Onde está Jacques Aphonsus?”. O Barão de Rothschild e a Quadrilha de Plymouth, que então não se importavam com Jacques, ficaram preocupados. A resposta estava bem debaixo do nariz de todos.

Jacques apareceu em um lugar exatamente igual à Escola Saint-Magdalena. Como em um dia regular, ele entrou no prédio.

O que Jacques não sabia é que ele estava um ano mais velho, prestes a vincular-se a uma turma que teria nove anos de escola.

Para buscar pistas de quando ele estava, procurou algum mural de avisos. Encontrou papéis com nomes de alunos, e em um deles seu nome estava escrito.

Jacques foi para a respectiva sala de aula. Alunos já estavam chegando. Uma pessoa em especial chamou-lhe a atenção. Era Cleópatra, integrante da Quadrilha de Plymouth (de sua dimensão).

“Cleópatra?”, perguntou Jacques.

“Sou eu. Quem é você?”, disse Cleópatra.

“Você não me conhece.”

De fato, a Cleópatra desta dimensão não conhecia Jacques. Cleópatra conhecia-o na sua dimensão.

“Jacques? O que você faz aqui?”, perguntou uma voz conhecida.

Era Paraná, um antigo amigo nosso, que desaparecera anos atrás. Jacques deu um abraço forte nele.

“Eu viajei no tempo, Paraná! Como senti sua falta! Flatcher também...”, disse Jacques.

“Não me diga que você conheceu a professora Lilian.”

“Conheci! Foi ela quem me mandou para esta dimensão.”

“Falando nela...”, Paraná apontou o dedo na direção da porta.

“Bom dia!”, disse a professora Lilian, sentando-se à sua mesa e organizando suas coisas.

Ao término da aula, Jacques foi falar com Lilian.

“Oi Lilian.”

“Oi.”

“Eu conheço você da minha dimensão.”

A professora fez expressão de dúvida.

“Você e seu marido, Wagner Apfelstrüdel, construíram uma máquina espaço-temporal e me trouxeram para está dimensão! Seu experimento funcionou!”, explicou Jacques.

Lilian ajeitou-se na cadeira.

“Jacques, entenda que o tempo é como uma estrada. Você pode ir para frente e para trás. Mas jamais poderá criar uma nova estrada. O que minha versão do passado fez é o que os físicos chamam de ‘entropia’.”

“Eu tenho a impressão de que eu não fui o primeiro, nem o último a ter feito essa transição.”

“Você está certo. Meu marido Wagner abriu esse universo paralelo e isso só vai acabar quando ambos os universos chegarem ao fim.”

Havia um detalhe nesse universo. Eu não existia, porque estava em Montréal, além de outras figuras existentes na dimensão de Jacques não se lembrarem dele na nova dimensão. Jacques praticamente renasceu nesta dimensão. Sua família, porém, existia e lembrava-se dele.


Parte IV: Anvers

Um ano depois, quando Jacques estava com treze anos, ele visitou a cidade de Antuérpia com a Magnetita Escola de Inteligência Secreta (ou Escola Saint-Magdalena).

Naquele ano, a professora Lilian da dimensão 1 enviou onze jovens para a dimensão 2. Alguns deles com sede de sangue por Jacques.

Um deles, Geisel, formou a pior turma de encrenqueiros da instituição, a Gangue do Alemão. Geisel era o líder; Rousseff (outro viajante dimensional que implicava com a voz de Jacques há alguns anos) era o general segundo no comando; Imperador e Teryiaki eram os soldados que, influenciados por Geisel, colocavam a mão na massa. Todos, em algum momento, haviam experimentado viagem dimensional. A Gangue era composta por um alemão, um russo, um italiano e um japonês. Fascinante.

Aconteceu algo surpreendente em Antuérpia, que quase levou Jacques a participar de um julgamento no Tribunal.

Ao final do primeiro dia em Antuérpia, no litoral da Holanda, Jacques recolheu-se em sua acomodação. Seus colegas de quarto eram Marc Fountain (ele chegara misteriosamente à dimensão 2 no ano anterior, dizendo que estava em missão de campo em East Sussex); Pedróvski e Michaelis.

Alguém bateu à porta. Era Imperador, dizendo para Jacques reportar-se ao Quartel General da Gangue do Alemão.

“Vá.”, disse Fountain.

Geisel, o líder do grupo criminoso, pediu a Jacques para que medisse seu órgão sexual. Meu amigo foi ao banheiro com uma régua. Segundos depois, voltou.

“E aí?”, perguntou Teryiaki, que era asiático.

“Três.”, disse Jacques.

“Três, o quê?”, perguntou Geisel.

“Três centímetros...”, disse Jacques.

Os integrantes da Gangue do Alemão caíram na gargalhada e Jacques foi embora.

Paraná convidou Jacques para jogar uma partida de bilhar na sala de lazer. Eles não contavam com a chegada dos encrenqueiros da Gangue do Alemão.

“Todo mundo no chão!”, gritou Rousseff. “É uma ordem!”

Jacques e Paraná não se moveram.

Geisel olhou no fundo dos olhos dos dois e agarrou Jacques, pondo-o de frente para a parede e de costas para ele. O alemão tomou o taco de bilhar das mãos de Jacques e colocou-o no ânus do jovem, introduzindo e retirando diversas vezes.

“Pede para sair!”, berrou Geisel.

Rousseff, Imperador e Teryiaki caíram na gargalhada, mais uma vez.

No dia seguinte, os alunos visitaram a Ilha que foi apelidada de Fernando Henrique, em homenagem ao ex-presidente brasileiro que doou fundos para Holanda reconstruir a cidade de Antuérpia, depois da Segunda Guerra Mundial.

O banheiro da Ilha de Fernando Henrique era uma casinha dividida entre masculino e feminino. Não havia luz no banheiro. Quando Jacques foi usá-lo, ele deixou a porta encostada. Não percebeu que o vento abriu a porta, revelando outras pessoas na fila, entre elas o Conde Rubro (de aspecto vampiresco) e Madame Roquefort (recém-chegada da França).

Jacques sentiu uma leve pressão em suas costas, como se alguém (talvez o Conde Rubro) lhe atirasse uma frutinha. O jovem virou-se e encontrou tais nobres personalidades, de calças abaixadas.

Madame Roquefort sentiu-se ofendida e correu para alertar os professores acompanhantes, entre eles, o severo professor de Economia Global.

“Deixa estar.”, disse o arrogante professor. “Trataremos desse assunto com a Chefe.”

A Chefe era a supervisora das turmas na Magnetita Escola de Inteligência Secreta. Todos a temiam. Entrar em seu gabinete era desafiador.

De volta à Yuka Léon, cidade criada por imigrantes mexicanos na Inglaterra, Jacques resolveu-se com a Chefe, em poucas reuniões, graças ao seu comportamento exemplar. Não se pode dizer o mesmo de Geisel e os outros da Gangue do Alemão.

O líder recebeu uma advertência por praticar atos sexuais em público. Rousseff retirou-se da instituição por comportamento inadequado. Imperador e Teryiaki não aguentaram a pressão e delataram todos os crimes que a Gangue havia cometido nos últimos meses.

 

Parte V: Paradis

No ano que Jacques completara quatorze anos, ele mudou-se de Plymouth para Dorset. Seus pais não suportavam mais os vizinhos, nem as atrocidades cometidas pela Quadrilha de Plymouth (que passou a existir quando Jacques chegou a dimensão 2).

Era hora de dizer adeus para Cleópatra, Medusa e Anormal. Pelo menos, por enquanto, até a situação mudar.

Naquele ano, Jacques viajou com a Escola Saint-Magdalena para as terras altas da Escócia. No último dia, ele recebeu um telegrama de Paraná, por meio de Marc Fountain.

“Tchau para todos.”, dizia o bilhete.

“Ele morreu.”, afirmou Fountain.

“Não, caro amigo, ele libertou-se!”, corrigiu Jacques. “Nosso amigo Paraná encontrou a saída!”

No ano em que Jacques tinha quinze anos, o mundo pareceu desabar sobre sua cabeça.

A Magnetita Escola de Investigação Secreta levou os alunos para conhecer as planícies pantanosas do País de Gales e suas diversas formas de ocupação do espaço.

Jacques, ao mostrar alguns arquivos para seu colega de turma, acabou sentando em cima de seus óculos de leitura.

De volta a Yuka León, Jacques encontrou sua família e eles disseram-lhe que haviam conversado com o então primeiro-ministro da Itália, e agora Chefe da Escola Saint-Magdalena, Sílvio Berlusconi. Ele disse-lhes que Jacques estava indo de mal a pior nas questões acadêmicas, e que ele precisava se esforçar para melhorar suas notas.

No dia seguinte, Jacques emocionou-se na frente de sua sala, tendo que ser consolado pela sua aliada Esfalerita e pelo professor de Ciências.

Faltando poucos dias para terminar o ano letivo, Jacques Aphonsus falou para Esfalerita encontrá-lo na cobertura do prédio da Escola Saint-Magdalena. Chovia naquela ocasião.

Esfalerita contou-lhe que havia conversado com a professora Lilian e ela mostrou-lhe o artefato de viagem espaço-temporal. Jacques se deu conta de que, apesar de ele estar no final de sua jornada, outros agentes (outros alunos) entrariam em contato com a professora Lilian e o artefato misterioso.

“O que você queria me contar?”, perguntou Esfalerita.

“Este é meu último ano neste universo. Vou me libertar, Esfalerita! Vou conhecer o mundo como ele é. A professora Lilian me prendeu nesta dimensão há quatro anos, e agora estou livre!”, disse Jacques.

“Fico feliz por você, agente Jacques Aphonsus!”, disse Esfalerita.

Jacques sorriu de volta e lembrou-se do ano anterior, quando apresentou um show de mágicas para seus colegas de turma. Esfalerita fora uma de suas assistentes. A outra ajudante era Jamie Blont. Jacques preparou um truque em que ele atravessava um pedaço de papel usando apenas uma tesoura. O outro truque que ele apresentou foi ideia de Jamie. Jacques, usando uma cartola, retirava diversos animais de pelúcia dela, fazendo alguns comentários cômicos.

“Adeus, Esfalerita. Quem sabe a gente não se encontra em outra dimensão?”, disse Jacques, abraçando sua aliada.

Jacques teve outro lampejo de memória. Ele estava agora no ano em que tinha treze anos. Seus amigos de sala haviam combinado de se juntar e comer pizza. O evento seria ministrado na casa de Soda Cáustica.

Meu amigo vestiu sua melhor roupa, uma camisa de botão verde, uma calça jeans e um par de sapatos. A casa de Soda Cáustica era no centro de Yuka León. Jacques chegou atrasado, mas foi recompensado pela presença de Paraná, Marc Fountain, Lilla Takeda (sua dupla nos trabalhos de História), Geisel, Pedróvski, Duquesa d’Avignon, Conde Rubro, Soda Cáustica... Todos os seus amigos estavam lá.

Depois de comer, a turma encontrou-se em uma espécie de foyer externo. Algumas meninas estavam brincando com os garotos de se esconder no banheiro. Jacques quis participar também e fechou a porta do lavatório. Meu amigo não percebeu que a Duquesa d’Avignon havia deixado seus dedinhos na dobradiça. E Jacques forçou para fechar. Não foi por mal.

Duquesa d’Avignon berrava de dor. Jacques fugiu para o canteiro central da casa de Soda Cáustica. Marc Fountain culpou-o pela atitude. Soda Cáustica, compadecida, abraçou Jacques de uma maneira nunca antes vista.

Esfalerita observou Jacques digitar alguns comandos no artefato criado pela professora Lilian e pelo ministro Apfelstrüdel. Uma cortina de fumaça violeta apareceu na frente dos dois.

Jacques lembrou-se de quando tinha doze anos e visitou a cidade de Rotterdam na dimensão 2. Seus colegas de quarto eram Marc Fountain e Pedróvski.

Na primeira noite, Jacques não cometeu o mesmo erro de ir de sunga na piscina. Preferiu jogar carteado na sala de lazer.

Enquanto Jacques tomava banho, seu aliado Marc Fountain deixou a porta da acomodação aberta. Meu amigo percebeu algo de errado e hesitou para sair da cabine do chuveiro.

Jacques viu vultos, que pareciam ser seus colegas de sala. Um deles, grandalhão, lembrava a figura de Teryiaki. Apesar do vidro fosco, quem passava poderia ver suas partes íntimas. Jacques não soubera por que Marc Fountain fizera isso.

Jacques Aphonsus convocou uma reunião extraordinária na acomodação da Chefe junto de Marc Fountain para esclarecimento do caso. Fountain desculpou-se do ocorrido.

Depois do jantar, Marc Fountain aprontou outra presepada.

Jacques trouxera para Rotterdam um pijama com estampa de pipoca e, ao vesti-lo, Fountain achou sensacional. Ele foi até o andar de cima chamar algumas meninas (entre elas, Madame Roquefort e Soda Cáustica) para ver a obra de arte. Qual não foi a surpresa de Fountain ao perceber que as meninas adoraram o pijama de Jacques Aphonsus?

Jacques e Esfalerita entreolharam-se. Em menos de um segundo, Esfalerita olhava seu aliado de tantas missões de campo dissipar-se na névoa violeta provocada pelo artefato da professora Lilian.

Tudo ficou branco.

...

O que aconteceu a partir daí, é um mistério. Sabe-se que Jacques libertou-se das dimensões criadas pelo ministro Wagner Apfelstrüdel. Ao final dessa aventura, Jacques gravou em áudio tudo pelo que passou e enviou a fita pelo correio comum para o escritório onde trabalho, em Montréal.

De tudo isso, eu creio que podemos acreditar que todos os personagens, de certa forma, libertaram-se do jogo de dimensões e fractais temporais criado com o único propósito de fazer os jovens ingleses estudar mais.

Para os que ainda estão vivendo em realidades paralelas, tenha calma, sua hora vai chegar, e você, com certeza, libertar-se-á!


quarta-feira, 15 de julho de 2020

Informações sobre o caso Thiago Afonso (como tudo começou)


Roteiro da história "Zaco e Coda: perdidos numa selva" (nome provisório)

Personagens:

Thiago Afonso Martins
Zackarias Martins (pai do Thiago)
Maia Afonso Martins (mãe do Thiago)
Ceresa Tristina (madrasta do Thiago)

Marcos Fontana Martins
Cody Martins (pai do Marcos)
Bailey Fontana Martins (mãe do Marcos)

Natalie Amarante
Cirilo Amarante (pai da Natalie)
Maria Joaquina Amarante (mãe da Natalie)

Mariano Fukanaga (pai do Flatcher e da Beatriz)
Emma Fukanaga (esposa do Mariano)
Flatcher Fukanaga e Beatriz Fukanaga

Foco narrativo:
1ª pessoa/narrador-personagem

História:

Vá para o banco da Avenida Kogama e encontre o gerente que atende pelo nome de Eriberto. Entregue para ele o boleto que você recebeu na noite anterior e ele mostrará uma sala. Nela, haverá um objeto. Guarde-o por um tempo e devolva a Eriberto, porque aquilo é valioso demais. Será tentador, mas evite guardar por mais de um mês. A Natalie (minha assistente) está falando para eu parar de enrolar e ir direto à história. Acho que tudo começou quando saímos de férias. (Repensar)

Final de Novembro. Último dia de aula. Férias de verão chegando. O sinal tocou. Término da aula. Saímos correndo. Alguém encostou a mão no meu ombro. Pensei que fosse a diretora ou algum professor, mas era apenas um colega meu; ou melhor, um grande colega meu. Chamava-se Flatcher Fukanaga, filho de Mariano Fukanaga, gerente do Hotel em que meu pai morava quando criança, e de Emma Fukanaga, professora dele e de minha mãe. Meu pai, Zacarias Martins, fora muito bagunceiro quando criança, e agora, como sou filho dele, todo mundo acha que eu sou bagunceiro. Mas não é verdade! Não sou parecido com meu pai. Sou organizado igual ao tio Cody.
Fukanaga era meu melhor amigo, pois ele sempre me ajudava com tarefas importantes da escola. Na maioria das vezes era minha dupla em trabalhos. Houve uma vez em que ele foi meu advogado na brincadeira de tribunal, quando eu fui julgado por colar na prova. Ele tinha uma irmã mais velha muito bonita chamada Beatriz, mas a chamávamos de Bia.
— Oi Thiago! Vamos embora juntos? — disse ele.
Vamos lá! Oi Flatcher! Vamos!

Durante o percurso, íamos observando as construções e, ao mesmo tempo, conversando. Nós moramos numa cidade no interior do estado de São Paulo, chamada Juca Leão. Nela, há menos poluição. É uma cidade pequena e quase todos os cidadãos se conhecem. Em nossa cidade, também há uma usina de energia nuclear, que foi construída durante a ditadura militar no Brasil, nos anos 1970, para entrar no programa das “obras faraônicas”.

Convidei Flatcher para almoçar comigo em casa, afinal havíamos acabado de entrar de férias. Ao entrar, vi meu pai, minha madrasta, um policial, uma mulher bonita e uma menina, que devia ter a mesma idade que eu. Eles estavam sentados no sofá da sala, assistindo ao telejornal. Meu primeiro pensamento foi: “Será que meu pai, que é pegador, traiu Ceresa com outra e acabou com uma relação sexual, e minha madrasta chamou os tiras, porque ela não admite traição?”. Como sou muito ingênuo com meus pensamentos, e muito curioso, resolvi perguntar:
— Papai, você resolveu sair mais cedo do trabalho?
Os convidados pareceram notar minha presença e meu pai desligou a televisão.
— Thiago, estávamos esperando você. Conversaremos durante o almoço. Você deve ter notado que temos companhia.
Meu pai conduziu a tropa até a mesa redonda onde fazíamos as refeições. Eu sentei ao lado do Fukanaga, que sentou ao lado do policial, que sentou ao lado da mulher bonita, que sentou ao lado da menina, que sentou ao lado do meu pai, que sentou ao lado de Ceresa, que sentou ao meu lado. Havia uma lasanha à bolonhesa no centro. Meu pai abriu uma garrafa de tinto e começou a servir os adultos.
— Há treze anos, — meu pai começou. — em 1988, este cavalheiro que zela todos os dias por nossa segurança, o delegado Cirilo, encontrou, junto de sua esposa, Maria Joaquina, uma espaçonave em seu quintal. Graças à Equipe da Salvação, foi descoberto que o indivíduo dentro da nave era um recém-nascido do planeta Azeitona e que veio para a Terra, porque era a única esperança de seu povo. O extinto grupo entregou o bebê para a assistência social e eu e minha então esposa Maia Afonso — pude ver Ceresa Tristina fazer uma careta — adotamos o garoto, que passou a ser Thiago Afonso Martins.
Essa história me parecia estranhamente familiar, afinal meu nome era Thiago Afonso Martins.
— Isso explica alguma coisa. — eu disse. — Por que o policial está aqui?
Eu conhecia Cirilo de vista. Quando eu ia para a escola de manhã, ele estava indo para a delegacia, no sentido oposto. O delegado Cirilo disse:
— Thiago, você é muito especial. E quando digo especial, quero dizer que você representa uma ameaça para a população de nossa cidade. O doutor Breno, psiquiatra da Usina de Juca Leão, convidou você para fazer alguns testes. E quando digo convidou, quero dizer que ele obrigou você com ameaça de prisão. Dr. Breno é um homem poderoso, afinal ele é amigo do Zurique.
Henrique Zurique era prefeito de Juca Leão, eleito em 2000. Ele era industrial e magnata, que detinha grande parte do mercado bélico. Ele também era pré-candidato às eleições presidenciais de 2002 pelo Partido Pan-Brasileiro (PPB). Esse partido fazia frente ao Partido da Aliança Brasileira (PAB), que lançaria o metalúrgico Paulo Donnerstag para presidente no ano seguinte. Zurique acabaria não concorrendo à Presidência, deixando que seu aliado, o capitão do Exército Hermann Rademaker, do Partido da Irmandade Social (PIS), assumisse a corrida.
— O que a minha mãe pensa sobre isso? — indaguei.
— Maia foi sedada com clorofórmio e está amarrada no quarto da empregada, conforme nos orientou o doutor Breno por intermédio do delegado. — disse meu pai, em tom sério.
— Você sequestrou sua ex-mulher, tio Zacarias? — perguntou Fukanaga, interessado. — Isso é crime federal!
Meu pai pareceu não ouvir. Ele já fez coisas piores.
— Assim que você terminar sua lasanha, Thiago, você vai arrumar sua bagagem e partirá na viatura do delegado para a Usina. Sem nenhum “piu”.
Na minha cabeça eu podia jurar que tinha uma granja inteira de pintinhos, só para irritar meu pai.
Coloquei na mala meia dúzia de roupas íntimas, algumas camisetas, calças, pijama e o suficiente para passar uma temporada na Usina Nuclear, que foi construída para fazer frente a outras matrizes energéticas projetadas na Ditadura, como as hidrelétricas de Itaipu e de Sobradinho. Eu já imaginava que eu não era filho biológico de meu pai, afinal, não somos nada parecidos.
Meu tio Cody — que é gêmeo do meu pai — não gosta muito de aparecer. Ele fez faculdade de Economia fora do Brasil, mas ninguém sabe seu paradeiro. O que sabemos é que ele assume um cargo executivo no Banco Central de Juca Leão, mas sem detalhes. Seu filho, Marcos Fontana, também é recluso e misterioso.
Desci as escadas, coloquei a mala na viatura e dei uma última olhada na casa onde morei por treze anos.
— Vou sentir sua falta! — disse Fukanaga. — Eu tinha planejado um monte de coisas para a gente fazer nas férias, mas esse tal de doutor Breno estragou a festa.
— Vai ser rápido, cara. — eu disse. — Nem vai parecer que eu saí.
Despedi-me de meu pai e de Ceresa Tristina. Eu quis falar com minha mãe, mas o delegado não permitiu.
— Ordens do doutor Breno. — disse ele, com ar de autoridade.
Entrei na viatura. Ao meu lado estava sentada a garota que parecia ter a minha idade. No banco do motorista estava o delegado Cirilo e no banco do copiloto (como costumava dizer meu pai quando eu era menor) estava sentada a mulher bonita que agora me parecia familiar.
— Natalie. — disse a menina.
— Prazer, Thiago. Você deve ser a filha do delegado Cirilo.
— Sim. Parece que seremos vizinhos de cela.
— Você também está “detida” na Usina? — ao dizer “detida” eu fiz aspas com as mãos.
— Meu pai me inscreveu num programa do governo quando eu era pequena. Eles fazem testes com os jovens para detectar eventuais ameaças comunistas.
— Você acha que eu sou uma ameaça comunista?
— Nem de longe! Mas meu pai acredita que a sua chegada ao planeta Terra foi muito suspeita. Segundo ele, os soviéticos enviaram você para o Brasil com um soro na sua corrente sanguínea capaz de envenenar o presidente.
— A falha dessa teoria é que quando eu nasci a União Soviética já estava com os dias contados. A menos que...
— A máfia russa tenha se metido nisso. — Natalie completou.
— Você sabe o que aconteceu com a Equipe da Salvação?
— Eles foram dissolvidos pelo atual governo por disseminação de ideais de esquerda.
— Como eles descobriram que eu era do planeta Azeitona?
— Meu pai acha que isso foi uma mentira para encobrir o fato de eles simpatizarem com os comun...
A viatura estacionou na Usina. Era um enorme terreno com um reator no centro. Fomos recebidos por um homem grisalho vestindo jaleco de laboratório que se apresentou como doutor Breno. Um cientista levou Natalie, e o doutor Breno me acompanhou até a sala dele.
Havia um retrato de Paulo Donnerstag, metalúrgico e membro do Partido da Aliança Brasileira, pendurado na parede. Eu já deveria suspeitar que o doutor Breno fosse partidário de Donnerstag.
[Final inconclusivo.]

Colcha de retalhos
A narrativa que você acabou de ler está incompleta. Um dia vou terminar? Não sei. Eu comecei a escrever a história em um bloco de notas do tablet em janeiro de 2012, deixei fermentando alguns anos, e voltei em julho de 2018, com novas ideias. A produção da narrativa ficou parada por excesso de referências que eu estava colocando. Veja abaixo.
Referências baseadas: Primeira versão: série de televisão “Zack & Cody: Gêmeos à bordo” (alguns personagens), romance "A pirâmide vermelha", de Rick Riordan, novela “Fina Estampa” (veiculada na TV Globo em 2012). Segunda versão (com ajustes): série “Stranger Things” (Usina Nuclear e doutor Breno).
Neste ano, 2020, assisti a uma série chamada “Dark”, que me inspirou a dar continuidade a esta história, acrescentando viagens no tempo e realidades paralelas. Não farei a continuação aqui. Leia abaixo um possível segmento à jornada de Flatcher Fukanaga na busca de seu amigo Thiago Afonso. Nessa história, Flatcher está mais velho e quer fazer de tudo para reencontrar Thiago.

Carta de Flatcher Fukanaga a Thiago Afonso

O delegado Flatcher Fukanaga estacionou sua viatura na garagem de sua casa. Ao entrar, ele viu sua esposa deitada no sofá, com a televisão ligada. Fukanaga desligou a televisão, aproximou-se dela e sacudiu levemente seus ombros.
“Natalie, querida, eu cheguei… Você já pode deitar!”
A mulher abriu os olhos.
“São duas horas da madrugada! Isso são horas de voltar?”
“Perdoe-me. A delegacia estava cheia está noite. Eu estou exausto!”
“Está tudo bem. Eu vou me deitar no quarto. Seu jantar está na geladeira.”
“Obrigado, querida!”, Flatcher sorriu. “Boa noite!”
“Boa noite!”, Natalie sorriu de volta.

O delegado jantou e foi tomar banho. Vestiu seu pijama, deitou na cama, mas não conseguiu dormir. Por alguma razão, ele ficou pensando em seu velho amigo, Thiago Afonso, levado para “análises” na Usina nuclear. Esse caso o inquietava muito. Mas fazia tanto tempo…
Flatcher foi para seu escritório, onde ele podia pensar, sentado em sua escrivaninha. Ele pegou uma garrafa de salsaparrilha na adega e serviu um copo, antes de começar. O delegado escreveu uma carta para seu melhor amigo de infância, com base em todas as pistas que coletara até então.

Quarta-feira, 13 de agosto

Querido amigo,

A última vez que nos vimos foi há muito tempo. Nós ainda éramos moleques. Você confiara a mim que sua estada na Usina seria rápida, mas nós dois sabíamos que você não voltaria a sua vida de antes tão cedo.
Sabe, desde que você se foi, meus dias perderam as cores. Parece que minha vida tinha sido transformada em escalas de cinza. Conforme o tempo foi passando, eu fui conhecendo outras pessoas, mas o vazio deixado por você crescia exponencialmente.
Você conheceu uma voluntária que trabalhava na Usina, chamada Natalie Amarante. Pois bem, eu fiquei amigo dela, nós namoramos durante um tempo e, agora, estamos casados!
Eu investiguei muito seu caso, inclusive porque o então prefeito Henrique Zurique monopolizou todas as informações e inviabilizou o processo. Se eu consegui descobrir parte de seu paradeiro foi graças a muito esforço e a muitas noites mal dormidas. Tudo isso porque eu me importo com você, Thiago. Eu sempre me importei.
Há alguns meses, eu viajei para São Paulo (capital) para conversar com um dos membros da extinta Equipe da Salvação, o Agente E. Ele me contou toda a história de como você caiu na Terra e me mostrou sua análise semiológica do alfabeto da Javalândia. Eu tenho que confessar: a história que o delegado Cirilo contou naquele almoço, antes de você me deixar, diverge em alguns pontos da história que o Agente E me contou.
Cirilo disse que você chegou na Terra quando ainda era um bebê, e o Agente E disse que você aterrisou na forma de uma criança. Eu fiquei muito confuso quanto a isso.
Eu visitei a biblioteca de Juca Leão e encontrei uma edição do jornal local indicando que o depoimento de Cirilo batia mais com a história real. Afinal, o delegado Cirilo, junto de sua esposa, Maria Joaquina, tinha sido testemunha ocular. A Equipe da Salvação chegara alguns minutos mais tarde.
Alguns meses depois do seu sumiço, eu fui na Usina Nuclear falar com o Doutor Breno, encarregado da unidade. O cientista me disse que você já não estava mais por ali, e que o então prefeito Henrique Zurique o levara consigo para sua casa.
É fato que raras pessoas já penetraram a mansão de Henrique Zurique. Só entra lá com convites formais e não é qualquer um que pode ser convidado. Jornalistas e policiais, por exemplo, são os grupos menos preferidos de Zurique.
Para isso, meu amigo, eu preciso de sua ajuda. Eu não conheço ninguém que pode entrar na casa do ex-prefeito de Juca Leão. Minha esposa é candidata a Prefeitura do município, mas eu não sei se ela toparia fazer essa missão.
Por isso, eu confio a você responder a essa carta com informações precisas e objetivas do ocorrido nesses mais de dez anos que você foi levado.

Atenciosamente, Flatcher Fukanaga, seu amigo.

Flatcher Fukanaga leu e releu sua carta. Ele escolheu um envelope, tomando o cuidado para não deixar indícios que a carta era remetida da delegacia, e escreveu no verso “Para Thiago Afonso. Por favor, não abra se você não for Thiago Afonso”.
O delegado vestiu um casaco, calçou seus sapatos e foi encontrar seu mensageiro fiel. Marcaram o ponto de encontro na Ponte que atravessa o Rio Transversal. Seu mensageiro era um homem que usava sobretudo, gravata e chapéu. Flatcher sabia que era ele, afinal, quem mais ficaria plantado em uma ponte no meio da madrugada?
“A águia pousou.”, disse o delegado.
“A águia já está no ninho.”, disse o mensageiro.
“Eu preciso que você entregue esse envelope nas mãos do Thiago Afonso. Ele mora na Mansão Zurique. Você sabe onde fica?”
O mensageiro fez que sim com a cabeça.
"Todos sabem onde fica a Mansão Zurique."
Antes de os dois se dispersarem, Fukanaga disse:
“Certifique-se de que é ele mesmo.”
“Eu tomarei o cuidado, senhor.”

Thiago Afonso levantou de sua cama e foi para a copa tomar seu café da manhã. Sua mãe, Paola Helena, estava sentada à mesa, assim como seu pai, o imponente Henrique Zurique.
Enquanto seu pai lia as notícias do dia no Correio do Autoclismo, Thiago perguntou:
“Pai, quando eu vou poder sair dessa casa e estudar, trabalhar, viver... Você sabe, fazer coisas que pessoas normais fazem!"
“Você não é uma pessoa normal.”, respondeu Zurique, sem tirar os olhos do jornal. “Existem substâncias dentro do seu corpo que precisam ser drenadas.”
Thiago Afonso não respondeu. Terminou de tomar seu café da manhã e subiu para seu quarto. No corredor principal, Fofinha, como era conhecida a Governanta da Mansão Zurique, entregou um envelope para Thiago.
“O que é isso?”, perguntou ele.
“Apenas mantenha fora do alcance de seu pai.”, respondeu Fofinha, laconicamente.
Em seu quarto, Thiago abriu o envelope e leu a carta que estava dentro. Quando acabou de ler, percebeu que a polícia, ou melhor, o delegado da polícia, estava atrás dele; e o delegado tinha sido seu melhor amigo! De repente, ouviu seu pai chamar:
“Thiago, desça para fazermos a coleta!”
A coleta que Henrique Zurique se referiu era para retirar doses de uma substância presente no corpo de Thiago. Era por isso que seu pai não queria que seu filho saísse por aí. As pessoas poderiam pensar que ele era uma aberração.
O jovem desceu até o porão para fazer a coleta. No início, seu pai o amarrava em uma cadeira de dentista e Fofinha reforçava a segurança. Com o tempo, Thiago foi ficando menos resistente.
“Não vai doer nada.”, disse Zurique, segurando uma agulha hipodérmica. Ele sempre falava isso toda vez que eles faziam a coleta.
Seu pai injetara a agulha em sua testa para extrair o neurotransmissor inoculado em seu filho.
“Espere só a mídia descobrir isso!”, dizia Zurique, para si mesmo. “Eu vou dobrar minha fortuna! Quando eu revelar para a indústria farmacêutica que este soro é capaz de... Não se sabe do que esse soro é capaz, mas quando descobrirem, a ciência será revolucionada!”
Alguém bateu à porta. Era Paola Helena, esposa de Henrique Zurique, dizendo que uma pessoa telefonara, pedindo que Zurique atendesse. O magnata perguntou, de dentro do porão:
“Ele disse quem era?”
“É o cientista da Usina Nuclear... Ele quer discutir negócios...”
Henrique Zurique saiu do porão e dirigiu-se para o telefone. Enquanto, seu pai estava distraído, Thiago Afonso saiu do porão, subiu para seu quarto, e pensou em como responderia ao delegado da cidade.
[Final inconclusvo.]

Obrigado por ler até aqui.
Mais informações sobre eventos relacionados à Flatcher Fukanaga e à Thiago Afonso:
Primeira história em que Flatcher Fukanaga aparece: https://trespong.blogspot.com/2015/06/aventura-em-santos.html
Entrevista com Henrique Zurique (sobre cigarro): https://trespong.blogspot.com/2018/03/entrevista-com-henrique-zurique.html
História sem relação com o caso Thiago Afonso, mas que traz Flatcher Fukanaga como personagem: https://trespong.blogspot.com/2017/05/amizade-2-ilha-da-amizade.html

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