(LOBATO, Monteiro. Reinações de Narizinho. São Paulo: Círculo do Livro, 1921. 310 p.)
Resumo
Descreve o Sítio do Pica-Pau Amarelo. Caracteriza os
personagens de acordo com suas qualidades. Utiliza o bom-humor para prender a
atenção do leitor. Tendo em vista, a época (anos 1920), é possível observar
ideias racistas e sexistas ao longo da obra. Dialoga com personagens de outras
histórias, fazendo intertextualidade. Apresenta personagens como o Marquês de
Rabicó, o Visconde de Sabugosa, a boneca Emília, o Doutor Caramujo e o Príncipe
Escamado. Não conclui a história, deixando espaço para mais aventuras
acontecerem. Tem um bom uso de palavras da língua portuguesa, assim como
gramática, sintaxe e pontuação. O autor faz paralelo com sua infância no
interior de São Paulo na obra.
Palavras-chave: Sítio. Aventuras. Literatura.
Infância. Imaginação.
Fichamento
Nessa passagem, do capítulo intitulado “Sítio do
Pica-Pau amarelo”, o narrador fala da busca de Narizinho por muletas para a
boneca Emília, que teve a macela de sua perna entregue ao Tom Mix. Narizinho e
Emília encontram um besouro que fora “abusado” por Narizinho no início do
livro.
Narizinho foi. Três esquinas adiante encontraram o besouro mendigo, de
chapéu na mão à espera de esmolas. A menina já lhe ia oferecendo um pedacinho
de bolo quando o mendigo perguntou:
- Não me reconhece mais?
[...]
Pesarosa de sua desgraça, Narizinho pô-lo no bolso, dizendo:
- Fique quietinho aí e divirta-se com esses bolos. Vou levá-lo para o
sítio de vovó, onde poderá viver uma vida sossegada sem ser preciso tirar
esmolas. (LOBATO, p. 63)
Nessa parte, Narizinho e a boneca Emília são
convidadas para conhecer o Reino das Abelhas, mas ficam em dúvida se o convite
veio das Abelhas ou das Vespas. Assertivamente, elas chegam à colmeia e são
recebidas com honra. Narizinho faz um comentário sobre o modo de vida das
abelhas.
- Já reparou, Emília, como é bem-arrumado este reino? Uma verdadeira
maravilha de ordem, economia e inteligência! Estive no quarto das crianças. Que
gracinha! Cada qual no seu berço de cera, com pernas e braços cruzados, todas
tão alvas, dormindo aquele sono gostoso... O que admiro é como as abelhas sabem
aproveitar de modo que a colmeia funcione como se fosse um relógio. Ah, se no
nosso reino também fosse assim... Aqui não há pobres nem ricos. Não se vê um
aleijado, um cego, um tuberculoso. Todos trabalham, felizes e contentes.
(LOBATO, p. 67-8)
Esse capítulo, intitulado “As aventuras do príncipe”
(p. 117), conta quando o Príncipe Escamado e sua comitiva visitam o Sítio de
Dona Benta, pouco depois do casamento de Lúcia (Narizinho) e Escamado. No
excerto abaixo, podemos ver a magnanimidade /humildade /generosidade de
Príncipe Escamado quando Dona Benta e Tia Nastácia estavam “com medo” dos convidados
do Reino das Águas Claras.
- Nesse caso, prefiro voltar – disse [o príncipe] com dignidade. – Não me
julgo com direito de perturbar o sossego duma tão respeitável senhora. (LOBATO,
p. 121-2)
Nesse capítulo, intitulado “O gato Félix” (p. 145), um
suposto gato se diz ser o Gato Félix e reúne o pessoal do Sítio para contar “sua
história”. Estão presentes, Tia Nastácia, Dona Benta, Lúcia (Narizinho),
Pedrinho, a boneca Emília, o Visconde de Sabugosa (um milho embolorado de cartolinha
dentro de uma lata), e o suposto Gato Félix. Na passagem, intencional ou não,
Lobato faz uma citação direta ao acidente do Titanic, que aconteceu nos anos
1910.
- Espere. Estava eu comendo o último rato que comi no navio, quando
rompeu lá em cima um berreiro. Subi ao tombadilho para ver o que era e
encontrei o capitão dizendo que o navio tinha batido numa pedra e ia afundar.
(LOBATO, p. 149)
No capítulo intitulado “O circo de cavalinhos” (p.
221), Visconde de Sabugosa sofre uma “overdose de conhecimento” e precisa
passar por uma cirurgia para remover “manias de ciência” que entalaram em seu
estômago. O médico responsável seria o Doutor Caramujo. No excerto, o narrador
descreve a “casa” do Visconde de Sabugosa, o que explica por que ele é tão
inteligente.
A casa do Visconde era um vão de armário da sala de jantar. Dois grossos
volumes do dicionário de Morais formavam as paredes. Servia de mesa um livro de
capa de couro chamado “O Banquete”, escrito por um tal Platão que vivia
antigamente na Grécia e devia ter sido um grande guloso. A cama era formada por
um exemplar da “Enciclopédia do riso e da galhofa”, livro muito antigo e danado
para dar sono. Mas desde que o Visconde ficou uma semana inteira atrás da
estante e criou bolor pelo corpo inteiro, não era ali que ele dormia, para não
sujar o chão com seu pozinho verde; dormia na lata. Outro “móveis” –
armarinhos, cadeiras, estantes, também eram formados dos livros de capa de
couro que Dona Benta havia herdado de seu tio, o Cônego Agapito Encerrabodes de
Oliveira. Era naquela casinha que o Visconde passava a maior parte do tempo, lendo,
lendo que não acabava mais – e tanto leu que empanturrou. (LOBATO, p. 223)
No capítulo intitulado “Pena de papagaio” (p. 247), um
garoto invisível com uma pena de papagaio os leva para o “mundo das maravilhas”
para conhecerem os fabulistas La Fontaine e Esopo. La Fontaine explica o modo
de vida das formigas.
– Não param nunca, sempre ocupadas nos trabalhos caseiros – prosseguiu. –
Cortam folhas, picam-nas em pedacinhos e guardam-nas em perfeitos celeiros para
que fermentem. Nessas folhas um cogumelozinho se desenvolve, com o qual se
alimentam. São insetos de alta inteligência. A muitos respeitos a formiga está
mais adiantada que nós, homens. Há mais ordem e governo na sociedade delas. São
mais felizes. (LOBATO, p. 262)
Logo, Lúcia (Narizinho), Pedrinho e a boneca Emília encontram
o fabulista grego Esopo, que diz “palavras de sabedoria”. Esopo fica muito
admirado quando descobre que a boneca Emília é falante.
O grego sorriu com malícia.
– Nós, sábios, também não fazemos outra coisa. – disse ele. – Mas como
dizemos nossas tolices com arte, o mundo se ilude e as julga alta sabedoria.
Vamos bonequinha, diga uma tolice para o velho Esopo ver. (LOBATO, p. 267)
Resenha
crítica
A obra “Reinações de Narizinho”, de Monteiro Lobato, é
um excelente livro para jovens leitores e leitores mais maduros. Não existe
idade para leitura. Lobato é um grande escritor da literatura brasileira, sendo
um dos principais autores do movimento Pré-Modernista, junto de Euclides da
Cunha, Lima Barreto e Augusto dos Anjos.
O livro me lembrou de outros livros infanto-juvenis
publicados nos séculos XVIII e XX, como o Barão de Munchausen (de Rudolf Erich
Raspe, citado pelo próprio Lobato), Gulliver (Jonathan Swift), Gente e Bichos (Érico
Veríssimo), e outros. Pode-se dizer que, como autor infanto-juvenil, Monteiro
Lobato é um Ás.