Fotomontagem com cena do filme Os Incompreendidos (França, 1959), de François Truffaut. |
Pouco antes de sair
da estação ‘mediterrânea’, eu vi, dentro de uma lata de lixo, um adesivo com
dizeres políticos. Eu achei interessante a construção e, sem pensar duas vezes,
peguei o adesivo e percebi que a cola estava fresca. Eu colei-o na parede para
tirar uma foto, e depois eu iria ‘devolver’ ao lixo.
Uma funcionária do ‘mediterrâneo’
viu minha arte e repreendeu-me, dizendo que chamaria a segurança, e que aquilo
que eu estava fazendo era ‘vandalismo’. Eu disse que seria rápido, que era uma ‘experiência’.
Eu peguei o celular
do bolso, fotografei o adesivo e ‘devolvi-o’ ao lixo. O que eu fiz não foi
certo, eu sei disso. Mas também não era vandalismo, como alegara a funcionária.
Ser acusado de coisas que eu não fiz é minha especialidade.
Certa vez, quando eu
estudava na segunda série do ensino fundamental, eu fui ‘acusado’ de colar a
porta do armário de uma das salas de aula do segundo ano, também do ensino
fundamental. Havia alguns suspeitos, e eu era um deles, porque um guarda nos
vigiava no dia anterior.
De algum modo, as
autoridades conseguiram identificar o(s) culpado(s), e eu não fazia parte desse
grupo, graças à minha consciência limpa.
Outro caso ocorreu
quando eu tinha treze anos. O ano letivo estava no final. A turma da sala tinha
combinado de reunir-se na casa de um de nós, e Soda Cáustica, minha ‘guia
espiritual’, ofereceu-se para sediar o evento de confraternização.
Depois de comer a
pizza, nós fomos para uma espécie de jardim que tinha nos fundos do prédio de
Soda Cáustica, para conversar. A Gangue do Alemão estava desmembrada naquela
ocasião, porque o Imperador não estudava mais na escola. Estavam apenas o Rousseff,
o Teryaki e eu não tenho certeza se o Geisel estava lá...
No jardim, havia um
banheiro com um vaso sanitário e uma pia. Algumas meninas, em bando, resolveram
ir ao banheiro. A porta, naturalmente, ficou entreaberta e eu forcei-a para
fechar. O que eu não percebera foi que a Duquesa D’Avignon ficara com os
dedinhos no vão da dobradiça. E eu esmaguei-os. Com isso, a Duquesa D’Avignon
gritou e começou a chorar. Eu saí do jardinzinho e fui para um canteiro de
plantas, do outro lado.
O Tio Sam, um dos
meus amigos mais próximos naquela época, veio até mim para dizer que eu era um ‘monstro’
e que aquilo não devia ter sido feito. Quando o Tio Sam saiu, Soda Cáustica,
anfitriã e ‘guia espiritual’, apareceu e consolou-me com um abraço, dizendo:
“Está tudo bem... Eu
sei que você não é culpado!”
Eu estava usando uma
camisa polo verde com listras brancas finas. Aquela seria minha roupa favorita
desde então. Mas ela ficou velha e justa, indo para doação.
A conclusão a que eu
quero chegar com esses casos é que, na maioria das vezes, eu não sou o culpado
das ações que as pessoas ou as autoridades pensam que eu sou o autor. Eu não
passo de um incompreendido, vagando pelo espaço e pelo tempo buscando
reconhecimento dos meus valores.